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  • Foto do escritorAntonio Netto

Sustentabilidade não funciona



Sim, é isso mesmo. Sustentabilidade não funciona. Pelo menos não do jeito como é considerada no Brasil. Há vasto entendimento de que se trata de algo benéfico e que contém, em potencial, as respostas mais fundamentais para nosso futuro. Inspira uma radical mudança em nossos estilos de vida e no modo como fazemos negócios. Entretanto, como em todo processo de mudança, a resistência vem primeiro. No caso brasileiro, indústria e mercado financeiro continuam fazendo muito pouco e aguardando que alguém (uma terceira pessoa desconhecida) tome uma atitude (que ninguém sabe dizer qual é) para que todos os demais possam, então, rumar para a luz. Alega-se necessidade de apoio e estímulo governamental. Contudo, governos não são vanguardistas, são seguidores das tendências e necessidades apresentadas e exercidas pela sociedade.


A lógica dos benefícios carreados pela adoção de práticas sustentáveis já se demonstrou. Não há dúvidas quanto ao Triple Bottom Line. Não há incertezas quanto às vantagens e benefícios de assumir ESG como direcionamento de gestão. Contudo, tem-se a noção de que o business as usual é simplesmente mais em conta. No curto prazo pode até ser verdade, mas não é isso que vai nos levar adiante.


O mercado financeiro poderia liderar essa transformação, estimulando especialmente clientes corporativos à adoção de práticas sustentáveis efetivas em troca de melhor percepção de risco, melhores custos e condições gerais. Soluções há em abundância que propiciem uma ética de mercado mais robusta, próxima ao cidadão comum. Essas possibilidades são contadas por meio da última década de vida do Banco Real (ABN Amro). Este banco detonou um processo sem paralelo na indústria financeira nacional. Ouso dizer que um reflexo direto deste projeto foi a edição pelo Banco Central, em 2014, da Resolução nº 4327. Tivesse sido levada à sério, certamente teríamos um ambiente de negócios diferente.

A forma como os programas de sustentabilidade são relatados também enfrenta problemas. A academia tem sérias críticas aos modelos atualmente disponíveis de relatório integrado. Bom exemplo é o que diz o Dr. Renard Siew, da University of New South Wales que, em artigo de 2015, trata justamente disso. O argumento foi repetido em artigo de 2017, publicado pelo World Economic Forum. No mesmo sentido trabalha o Dr.Raine Isaksson, da Uppsala Universitet, Suécia. O relatório anual integrado interessa às indústrias e aos bancos. Às primeiras por ser o instrumento de comunicação de suas ações e aos segundos por ser ferramenta de análise de risco.


Nem os bancos estimulam que seus clientes corporativos emitam relatórios com melhor qualidade e nem as indústrias cobram dos bancos melhor avaliação (e custo menor) em função de seus programas de sustentabilidade.


Além disso, as certificações de conformidade poderiam também ver dias melhores. Sugiro verificar dentre as empresas listadas em índices de sustentabilidade quantas têm ISO 14000, ISO 26000 ou algo equivalente e de alguma forma relacionado à sustentabilidade. Vai se espantar. Sem compromisso e sem números tudo fica mais difícil.


Temos uma questão séria de ESG. O mercado em geral apresenta invejável repertório de desculpas. Costumeiramente falsos dilemas e sofismas.


O ponto, no entanto, não é suscitar polêmicas vazias. Ao contrário, sabemos o que pode ser feito para reverter um atraso de décadas. Miremos exemplos bem sucedidos. É preciso ser mais ousados nesse tipo de mudança. É necessário ser mais ousado na integração da sustentabilidade nas finanças. Com os juros básicos no patamar em que estão, uma ação conjunta de bancos e empresários ousados, focada em redefinir lógicas de mercado, criando novas formas de fazer negócio, de trabalho e estimulando profissões que ainda não existem produzirá efeitos profundos e duradouros em nossa economia. Produzirá riqueza.


Precisamos de um bocadinho de ousadia. Junto da nossa teimosia peculiar, da nossa garra construir uma narrativa diferente para o futuro do Brasil. Uma que seja calcada em transformações profundas e verdadeiras. Uma que nos permita sair da inércia cômoda de ver a banda passar.

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